Olha, olha... Os leigos e as mulheres ganham terreno onde faltam os homens. Que pena!
"Para quem tem religião, tanto vale uma celebração como a outra" por Elsa Costa e Silva
"Há quem não goste. Chamam-lhe a missa das mulheres, mas ainda vai muita gente." Leonor, de 70 anos, distancia-se do grupo que não vê com bons olhos as celebrações da Palavra, ao domingo, na igreja da terra, animadas por mulheres. A terminologia é incorrecta: não são missas, mas sim orações em que a comunidade se junta, na ausência do padre, para celebrar o Dia do Senhor. "Tendo vagar, vou. Quem tem religião, tanto vai a uma como a outra", sentencia.
Por enquanto, Leonor apenas assistiu às celebrações dominicais em que a animação está a cargo de leigos quando o padre Delmino, pároco de Mairos (Chaves), esteve internado ou de férias. Em outros locais da diocese de Vila Real, a experiência também não é nova. Mas a ideia do bispo é dar-lhe um carácter sistemático, a começar por Chaves e Montalegre. É que o número de padres é cada vez menor e a idade média aumenta. Logo, em muitas aldeias não será possível a celebração da missa todos os domingos. A solução é chamar os leigos a animar as celebrações previamente preparadas pelos padres.
Acolhimento
Nem sempre a medida será bem aceite. É que "o povo sacralizou muito a imagem do padre e custa entender a celebração sem o sacerdote", explica Vítor Pereira, de 30 anos, a prestar serviço em cinco paróquias de Montalegre. Igual percepção sobre a dificuldade que o povo poderá sentir tem António Jorge Ferreira, de 34 anos. Com quatro paróquias a seu cargo, isso significa que tem 28 aldeias - comunidades pouco habitadas, onde não pontuam crianças e jovens, e sim idosos. Em Trás-os-Montes, quase todas as aldeias têm uma pequena igreja, mas aí as celebrações rareiam como o povo. A missa dominical tem lugar apenas nas paróquias e mais tarde poderão ter de ser substituídas por celebrações da Palavra. "As pessoas já foram informadas. Todas as mudanças provocam perplexidades, mas a maioria vai acolher bem", diz António Jorge Ferreira.
"Se acabarem os padres, vão ter que ser mulheres e homens a fazer tudo", reconhece Mavilde, de 59 anos, também paroquiana em Mairos. Por isso, aceita sem dificuldade as celebrações sem padre. "Há homens que, às vezes, não vão porque não gostam, mas a maioria vai na mesma. E é quase igual à missa: só não há a parte da Eucaristia", explica. Ou seja, não há consagração do pão e do vinho, exclusivamente reservada aos padres. Sandra, que conversa ao portão com Mavilde, abana a cabeça em concordância e questiona: "Não há padres. Faltando este que temos, quem é que vem para cá?"
António Jorge Ferreira aconselha cautela: "E preciso tempo para preparar as pessoas. E certamente que haverá sucessos e fracassos". Domingos Santos, de 30 anos, também pároco em Montalegre, complementa: "É uma atitude a pensar no futuro. Os padres começam a ter uma certa idade e não há muitos para os substituir."
À procura de leigos
Por isso, os párocos de Montalegre e Chaves vão começar agora a seleccionar e a propor leigos para a preparação. Mas vai ser difícil seguir a recomendação do bispo da diocese para propor sobretudo homens. "São as mulheres que têm mais jeito para isso, são os que cantam, fazem catequese...", adianta Vítor Pereira.
Também Delmino Fontoura aponta que há dificuldades em "encontrar homens com boa dicção". E há ainda os problemas da literacia. Padre de quatro paróquias, tem nove aldeias a seu cargo. Numa delas, vai apenas propor um leigo para a preparação , porque só essa pessoa sabe ler. Noutra aldeia, onde moram 25 pessoas, só há duas jovens, de 16 e 17 anos, que dominam as artes da leitura. "Elas faltando, mais ninguém sabe ler."
Delmino Fontoura é responsável por perto de 1200 paroquianos. Ao domingo, conduz cerca de 25 quilómetros para rezar a missa no seu espaço pastoral. A economia da terra sobrevive à custa da batata e do leite. Tem, sobretudo, aldeias de idosos. "Cada pessoa que morre aqui, é uma casa que fecha", diz. Tem 70 anos, mas uma energia que lhe permite até gerir dois lares de idosos. Nasceu em Mairos, onde é pároco. Por enquanto, diz, ainda não haverá necessidade de ter leigos a animar celebrações. Mas "é bom prepará-los para o futuro".
domingo, 14 de janeiro de 2007
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