Múltiplas inteligências, Múltiplos talentos
A partir das pesquisas do neuropsicólogo americano Howard Gardner, sabe-se que a inteligência representa a capacidade do humano de criar a partir do que aprendeu culturalmente e do que desenvolveu em seu cérebro. Então, o que significa o potencial múltiplo da inteligência humana?
Essa capacidade de criar é múltipla porque pode revelar diferentes habilidades intelectuais ou competências cognitivas. A inteligência é um potencial múltiplo porque representa a potência biológica e cultural que pode multiplicar-se, dando vez ao surgimento de outras habilidades e competências. Isso é comum a qualquer indivíduo. Como é que esse potencial pode desenvolver diferentes inteligências?
O segredo está nos processos educativos que os seres humanos vivenciam, na formação moral e na orientação para a vida. Então, a inteligência é um potencial múltiplo porque pode se fazer e refazer culturalmente, e revelar-se de multiplas formas. Vejamos:
A inteligência linguística
É um potencial que revela a capacidade do indivíduo de aprender noções dos códigos linguísticos, guardá-los na memória e aplicá-los criativamente. Traduz o valor da competência de escrever, interpretar e aplicar palavras e frases em situações de comunicação. Essa inteligência está relacionada com as oportunidades que o indivíduo tem de vivenciar aprendizagens sobre a linguagem.
A inteligência linguística revela-se no domínio da palavra, tanto representada por códigos escritos marcados em papéis e pedras, quanto na expressão oral da fala. É um tipo de inteligência que se desenvolve nas interacções iniciais da vida do indivíduo, com a aprendizagem da linguagem.
A inteligência matemática
É um tipo de inteligência que se revela na capacidade mental do humano de guardar, na sua memória, informações de representações de quantidade e de aplicar essas informações no quotidiano, resolvendo problemas. A inteligência matemática é um potencial que revela a capacidade do indivíduo de criar soluções factíveis, com base em representações numéricas. Essas soluções são rapidamente formuladas pela mente e apresentam coerência antes mesmo de serem representadas materialmente.
A inteligência musical
Trata-se de um potencial que revela a capacidade do indivíduo de aprender sons e ritmos e de interpretá-los, concebendo novos contornos melódicos com arranjos musicais. Há evidências de que “certas áreas do hemisfério direito do cérebro são activadas no desempenho da percepção e da produção de músicas”. A inteligência musical revela-se como o potencial do indivíduo para atribuir significados a sons, representá-los e elaborar conhecimentos a partir deles. A criação da música mostra-se como uma actividade cultural denominada de composição.
A inteligência espacial
É uma inteligência que se traduz na percepção dos espaços. O indivíduo é capaz de executar modificações sobre percepções iniciais de espaço, recriando aspectos, mesmo na ausência do contacto material. Essa inteligência permite que indivíduos desenhem, mapeiem e visualizem objectos em várias dimensões e representem imagens internas.
A inteligência corporal
Essa inteligência, que se revela na capacidade do indivíduo de usar o próprio corpo com habilidades que se expressam nos movimentos. Trata-se de uma competência responsável pelo controle dos movimentos corporais, criando representações possíveis de serem executadas pelo corpo, em espaços e situações diversas (dança, desporto, teatro, etc).
A inteligência intrapessoal
É uma inteligência que revela aspectos introspectivos de reflexão e autocompreensão manifestados na interpretação de sentimentos e emoções, relacionando-se a linguagens que servem de base para entender e executar comportamentos. Um indivíduo que desenvolveu essa inteligência revela, nos seus comportamentos, o interesse de conhecer-se a si mesmo e de aprender com os seus erros a elaborar novos comportamentos úteis ao grupo social com o qual se relaciona. O autismo e a esquizofrenia exemplificam casos de indivíduos com a inteligência intrapessoal prejudicada.
A inteligência interpessoal
É um potencial que revela a capacidade humana de se comunicar, de observar e fazer distinções entre indivíduos quanto às necessidades, desejos e escolhas. Essa é uma inteligência que se manifesta com aprendizagens que envolvem sentimentos de colaboração e interacção. Um dano nessa área pode provocar mudanças na personalidade, como por exemplo, a doença de Pick, uma demência pré-senil, que tem como consequência, dentre outras, uma rápida perda das boas-maneiras sociais.
A inteligência naturalista
Trata-se de um potencial da inteligência que é demonstrado em comportamentos criativos, que associam saberes adquiridos no quotidiano do senso comum a conhecimentos adquiridos com métodos científicos que sejam relacionados, não só à vida social, mas também, ao ambiente natural. A inteligência naturalista aplica informações sobre as condições biológicas da natureza na compreensão da vida no mundo amplo. O potencial naturalista é valorizado culturalmente, tanto no senso comum, quanto na esfera da ciência.
A inteligência espiritual
Essa inteligência é demonstrada como a capacidade do indivíduo de compreender fenômenos que não são pura matéria ou física, mas que constituem abstrações que são valorizadas em diferentes sociedades. A inteligência espiritual revela a competência do indivíduo para lidar com informações que não são adquiridas em relações materiais, mas constituem mundos sobrenaturais e abstratos.
A inteligência existencial
Essa inteligência surge da capacidade humana de “se situar em relação aos limites extremos do mundo como o infinito e o infinitesimal”. Esse “situar” ocorre em relação à condição humana de existir e representar o mundo com significados sobre a vida, a morte, o destino do mundo, o porquê do amor e o significado da felicidade. É um tipo de inteligência que lida com informações sobre a condição humana, criando conhecimentos que implicam na orientação da vida social. Indivíduos que desenvolvem esse tipo de inteligência são actuantes em sistemas filosóficos, científicos e religiosos; lidam com a elaboração de princípios que orientam sociedades; buscam desconstruir paradigmas com a elaboração de novas noções que validem os acontecimentos sociais, como por exemplo, a instituição de direitos.
A inteligência moral
Explicitar uma inteligência moral requer um estudo aprofundado na esfera da moralidade que inclua uma investigação sobre “personalidade, individualidade, desejo e sobre a realização mais elevada da natureza humana”. Pensar numa inteligência moral torna-se aceitável quando passamos a interpretar que o sentimento de justiça direcciona decisões, aplicação de leis e reconstroem modos de convivência. É possível constatar, por exemplo, que ao longo de nossa evolução, lidamos com a moral como qualidade essencial da vida humana. Refletimos e elaboramos conhecimentos tendencialmente preocupados com o que é “próprio e impróprio, certo ou errado, justo ou injusto”.
Muitas crianças revelam altas capacidades num ou mais domínios destas inteligências. Como vimos, nem todas têm espaço de expressão e desenvolvimento na escola pelo que muitos alunos sobredotados não encontram ali lugar para tirarem partido do seu potencial. E isso pode trazer sérios prejuizos para a sua plena realização.
Fonte: Edna Brennand e Giuliana Vasconcelos, in "Ciência & Congição" (2005). Adaptado.
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