O teor da crónica da jornalista Fernanda Câncio (FC) publicada no Diário de Notícias em 28 de Março de 2008, intitulada «Adolescentes, inimputáveis e tevês», provocou-me tamanho desconforto que me vejo forçado a escrever-lhe manifestando as razões para esse sentimento.
A estratégia de FC, desastradamente exposta na chamada em texto com letra maior «A birra da miúda é mais grave do que o crime das TV?» consiste em simultaneamente minimizar a falta da menor e escondê-la atrás do empolamento ad nauseum dos abusos televisivos.
A estratégia de FC, desastradamente exposta na chamada em texto com letra maior «A birra da miúda é mais grave do que o crime das TV?» consiste em simultaneamente minimizar a falta da menor e escondê-la atrás do empolamento ad nauseum dos abusos televisivos.
Concretamente, o que eu vi no YouTube e nas TVs foi uma jovem de 15 anos, por coincidência a idade actual da minha filha, HISTRIONICAMENTE AOS BERROS PARA COM UMA SENHORA DE 60 ANOS, abusando da sua já natural debilidade e impedindo-a física e objectivamente de exercer dois direitos: tomar posse de um telemóvel e sair da sala de aula.
Se João Miguel Tavares na sua crónica no DN de 25 de Março de 2008 também define o mesmo acto como «birra», fá-lo num registo diametralmente oposto: define-a como uma «miúda de 15 anos a fazer birras de 3», ou seja, ironicamente humilha-a ao estabelecer aquela comparação etária e, simultaneamente mas não menos importante, não a desresponsabiliza.
Fernanda Câncio faz algo inteiramente diverso: refere-se à birra aos 15 anos como se ela fosse uma ocorrência natural nessa faixa etária e não fosse de espantar tamanha histeria; põe em causa que «tenha existido insulto ou propriamente agressão», como se uma jovem de 15 anos a BERRAR ESTRIDENTE E REPETIDAMENTE A UMA SENHORA DE 60 ANOS não fosse um insulto (não por acaso, FC refere na sua crónica a idade da jovem mas nunca menciona qual a idade da docente, pois o fosso etário realça o escabroso da cena) e impedi-la pela força física de exercer os seus direitos (apoderar-se do telemóvel e sair da sala) não fosse um acto agressivo. Fernanda Câncio não quer que sejamos cegos, pede-nos apenas para sermos invisuais…
Depois, para fazer passar despercebida esta pequena habilidade na arte de distorcer a realidade, atira-nos com o abuso que as TVs fizeram do caso, insinuando até que à docente perturbará mais a retransmissão das imagens do que o que ela terá sentido dentro da sala de aula. Dizem-nos os media que a professora apresentou queixa da jovem e dos restantes elementos da turma, mas não das TVs. A incessante retransmissão das imagens não só entristece a docente, o que é naturalíssimo, como também lhe afectará o discernimento e a capacidade reivindicativa?
Aplicando o raciocínio enviesado exposto por FC, segundo o qual a gravidade do crime de retransmissão das imagens seria muito superior à gravidade do ocorrido dentro daquela sala de aula, chegar-se-ia à conclusão que a repetição das imagens do massacre do Cemitério de Santa Cruz ocorrido em Timor em 12 de Novembro de 1991, sem que tenha sido ocultada a face daquele ferido prostrado junto às campas, foi um crime maior que o cometido pelos soldados indonésios… Pois sim.
Por fim, uma palavra de apreço pela posição reiteradamente assumida pelo Senhor Procurador Geral da República, Dr. Fernando Pinto Monteiro, em relação aos ilícitos ocorridos dentro das escolas. A tese do Ministério da Educação e doutros protagonistas, a que FC parece juntar-se, de estarmos apenas perante problemas de indisciplina e, portanto, do foro do Ensino/da Escola, faz tanto sentido como afirmar que uns murros e insultos nos Hospitais são problemas de Saúde e pontapés e ofensas nas Repartições de Finanças são assuntos Fiscais. Meus caros façam-nos um favor: calem-se.
António José Matos Marques
Braga
Ver crónica de FC, aqui.
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