sexta-feira, 13 de março de 2009

“Séquesso” – Henrique Raposo

«A pátria adora conversar sobre professores.
A pátria, porém, nunca fala sobre educação.
Portugal ainda não arranjou coragem para lidar com este facto: os alunos acabam o secundário sem saber escrever. Parece que os professores vão fazer uma 'marcha da indignação'. Pois muito bem. Eu também vou fazer uma marcha indignada. Vou descer a avenida com a seguinte tarja: 'os alunos portugueses conseguem tirar cursos superiores sem saber escrever'.
A coisa mais básica - saber escrever - deixou de ser relevante na escola portuguesa. De quem é a culpa? Dos professores? Certo. Do Ministério? Certo. Mas os principais culpados são os próprios pais. Mães e pais vivem obcecados com o culto decadente da psicologia infantil. Não se pode repreender o "menino" porque isso é excesso de autoridade, diz o psicólogo. Portanto, o petiz pode ser mal-educado para o professor. Não se pode dizer que o "menino" escreve mal porque isso pode afectar a sua auto-estima. Ou seja, o rapazola pode ser burro, desde que seja feliz. O professor não pode marcar trabalhos de casa porque o "menino" deve ter tempo para brincar. Genial: o "menino" pode ser preguiçoso, desde que jogue na consola. Ora, este tal "menino" não passa de um mostrengo mimado que não respeita professores e colegas. Mais: este mostrengo nunca reconhece os seus próprios erros; na sua cabeça, 'sexo' será sempre 'séquesso'. Neste mundo Peter Pan os erros não existem e as coisas até mudam de nome. O "menino" não escreve mal; o "menino" faz, isso sim, escrita criativa. O "menino" não sabe escrever a palavra 'recensão', mas é um Eça em potência.
Caro leitor, se quer culpar alguém pelo estado lastimável da educação, então, só tem uma coisa a fazer: olhe-se ao espelho. E, já agora, desmarque a próxima consulta do "menino" no psicólogo.»
Henrique Raposo, no "Expresso" de 8 de Março de 2008

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